terça-feira, 20 de outubro de 2009

17/10/2009 | N° 10560
COTIDIANO | CIRO FABRES

DONA ANA, UMA AUTORIDADE

Para início de conversa, aprendi respeito em casa, pelos dois costados, pai e mãe. Sabia o meu lugar. E nunca me bateram, atravessei a infância incólume, sem uma chinelada na bunda. Lembro certa vez de um beliscão no braço, mas foi só. Nunca levantaram a voz. Gritos então, nem pensar. Autoridade se manifestava no silêncio e na firmeza da voz.

Dona Ana também não levantava a voz. Dona Ana era uma autoridade, como não são mais a autoridade que deveriam ser os diretores de escola hoje em dia. Dona Ana Oliva Dorneles, a primeira diretora que me foi apresentada em vida, ao entrar pela primeira vez no Grupo Escolar Demétrio Ribeiro, escola estadual de referência na distante Alegrete, no alto de meus 6 anos. Nunca gritou, nunca se esganiçou. Sua presença bastava. Aquilo eram outros tempos, sim, mais autoritários, anos terríveis, anos 60, mas não eram autoritárias as práticas de Dona Ana. Apenas o exercício da autoridade, que se traduzia no respeito, logicamente que impregnado da cultura pedagógica da época.

Escola ainda era espaço de respeito, terreno sagrado, que em muito pouco lembra o espaço de desautorização, para não falar desmoralização, de boa parte dos professores, não todos, ante seus alunos, que fazem e acontecem, e desrespeitam, e até agridem.

Desautorização pelos baixos salários, pela confusão pedagógica e desorientação familiar, pelo enfraquecimento institucional da escola, desvalorizada e deteriorada. Mas não são todos os que sucumbem a essa desautorização geral do professor, que há os vocacionados, e os educadores de fato, aqueles que descobriram, pelo conhecimento e sensibilidade, como conviver com os alunos. Feliz do aluno que ainda tem um professor de verdade.

Essa crônica eu devia a meus tios, moradores de Canela. “Faz uma crônica sobre a Dona Ana”, me pediam há algum tempo. Certamente identificaram nela uma personagem essencial nessa geleia geral sem consistência em que se transformou a educação. Está aí a crônica sobre Dona Ana, está aí a crônica sobre uma diretora de escola, antes de qualquer coisa uma professora, uma autoridade. Uma professora, apesar de tudo, ainda possível hoje em dia, capaz de combinar ideias próprias de seu tempo e de sua realidade com a conquista do velho e bom respeito, tudo em nome da cidadania de seus alunos.

Com dois dias de atraso, uma homenagem obrigatória ao Dia do Professor.